O primeiro lugar geral no vestibular 2011 da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Antônio Gomes da Silva Filho, foi excluído e não vai cursar Medicina. A Universidade alega que o estudante, de 21 anos, teria fraudado o histórico escolar para ser beneficiado pelo argumento de inclusão. O estudante nega que tenha cometido fraude e garante que todos os documentos apresentados são verdadeiros e que vai lutar na justiça pela vaga.
adriano abreuAntônio Filho diz que não usou de má fé nem fraudou documento
Um despacho do reitor Ivonildo Rêgo, do dia 17, determina, baseado no relatório da Comissão de Sindicância, a exclusão do candidato, que segundo ele, ‘omitiu gravemente o fato de que cursara os ensinos fundamental e médio em rede privada, submetendo-se desnecessariamente aos exames supletivos em Instituição Pública para o fim de buscar o chamado argumento de inclusão, desrespeitando até mesmo as regras do edital’.
De acordo com o relatório da Comissão de Sindicância- instalada pela UFRN após denúncia anônima- Antônio Filho concluiu os ensinos Fundamental e Médio em escola particular e ‘parece ter utilizado de má fé’ ao apresentar o documento de conclusão em escola de rede pública, na modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA) na ‘tentativa de tomar para si uma condição de aproveitamento indevido’, já que a universidade incluiu o EJA no argumento de inclusão.
Foi verificado ainda, que o estudante já fazia parte do quadro de alunos da UFRN ao ser aprovado no Vestibular 2009 para o curso de Odontologia. “Nessa ocasião o candidato informou à Comperve ter cursado os ensinos Fundamental e Médio em escola particular e que concluiu os estudos em 2006. No último vestibular (2011) ele declarou ter estudado em escola pública e disse ainda que concluiu os estudos em 2010. Ele infringiu edital do processo, apresentando um histórico escolar que confirmava a conclusão de seus estudos pelo EJA, quando já havia concluído o ensino médio em uma escola particular”, disse a vice-reitora da UFRN, Ângela Paiva.
Essa foi a primeira vez que a UFRN permitiu que estudantes do EJA fossem beneficiados com o argumento de inclusão. Antes, apenas os alunos do ensino regular da rede pública tinham direito ao argumento de inclusão. A Comissão de Sindicância constatou ainda que Pedro Hugo Alves Fontes, também se utilizou desse procedimento e foi aprovado para o curso de Medicina através do argumento de inclusão. Outros quatro casos de irregularidades no uso do argumento de inclusão, também de estudantes do EJA, estão sendo investigados pela Universidade.
A reitoria da UFRN vai encaminhar o relatório da Comissão para os departamentos dos alunos que abrirão processo administrativo. Nesse caso os estudantes que possuem vínculo com a universidade poderão ter suas matrículas excluídas.
O processo também será encaminhado ao Ministério Público, que investigará o caso. Isso porque de acordo com o relatório da Comissão de Sindicância, a conduta do aluno é capaz de ser recepcionada pelo Código Penal Brasileiro por falsidade ideológica.
“A Universidade lamenta muito o ocorrido, principalmente no caso de Antônio Filho, que teria sido aprovado no vestibular de medicina sem a utilização do argumento de conclusão”, disse a professora Ângela. Já Pedro Hugo, que é nosso aluno no curso de bacharelado em Ciência e Tecnologia, não passaria sem o argumento de inclusão.
Questionada sobre o porquê da Comperve ter fornecido o argumento de inclusão ao aluno, já que ele não tinha direito, a vice-reitora disse que a instituição avalia apenas os documentos entregados no ato da solicitação e não a vida pregressa do candidato.
“A Comperve acredita que há uma fé pública nos documentos apresentados pelos candidatos. Além disso, é impossível analisar documentos anteriores, já que temos um número alto de inscritos -este ano foram 28 mil pessoas. Na hora da inscrição todos os candidatos são iguais, o esperado é que eles usem de boa fé”, justificou Ângela.
A vice-reitora disse ainda que esse fato isolado não compromete a legalidade de todo o processo seletivo e aqueles que se sentirem prejudicados podem comunicar a Comperve, que o caso será investigado.
Argumento de inclusão
Argumento de Inclusão é um sistema de pontuação adicional, diferenciado, que toma como referência critérios sócio-econômicos e de desempenho dos candidatos da rede pública no processo seletivo (vestibular).
Constitui-se em uma ação transitória, objetivando ampliar o acesso dos alunos da rede pública que, mesmo apresentando um desempenho médio e acima deste no processo seletivo, colocam-se sempre em desvantagem em relação aos alunos da rede privada.
Procedimentos
O Cálculo do Argumento de Inclusão está baseado em um estudo que tomou como base dados da demanda e do desempenho dos candidatos da rede pública nos quatro últimos processos seletivos.
A aplicação dessa política no vestibular 2006 será dada pelo acréscimo do Argumento de Inclusão no cálculo do Argumento de Classificação de candidatos da rede pública.
Os Argumentos de Inclusão são definidos para grupos de cursos.
Estudante pode ter afrontado a Constituição
Diante da polêmica causada pela decisão da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, em excluir do Vestibular 2011 o estudante Antônio Gomes da Silva Filho, a TRIBUNA DO NORTE procurou um advogado para tentar esclarecer a questão.
De acordo com o advogado e mestre em Direito Constitucional, Paulo Renato Bezerra, qualquer pessoa que se utiliza do serviço público governamental com finalidade diferente da idealizada, com objetivo de obter pontuação extra em vestibular, acaba burlando a lei, ocupando uma vaga que poderia ser de quem realmente necessita concluir seus estudos e afronta a Constituição Federal.
“O argumento de inclusão existe claramente para oportunizar o acesso às Universidades Públicas de pessoas que estudaram em escolas públicas e, portanto, não conseguiram se preparar em pé de igualdade com os oriundos de escolas particulares. Aceitar uma dupla realização de ensino médio, sendo a segunda em escola pública apenas para que o benefício fosse concedido, é claramente desrespeitar até mesmo o princípio constitucional da igualdade”, disse o professor.
Ainda segundo ele, a Constituição Federal, ao dispor que a lei estabeleceria o plano nacional de educação, claramente, no art. 214, intencionou que esta colaborasse com a erradicação do analfabetismo, a universalização do atendimento escolar e a formação para o trabalho.
E é com base nessa orientação (Lei nº 9.394) que as unidades federativas, dentro de suas competências, acabaram criando políticas públicas que visassem a erradicação do analfabetismo.
“Estudar em escola particular e, depois, cursar um supletivo em escola pública para obter o benefício da pontuação extra, é burlar a intenção da própria política de inclusão. É tratar desigualmente. Mas como não houve julgamento ainda, vamos aguardar o posicionamento do Judiciário”, analisou Paulo Renato.
bate-papo - Antônio Filho » estudante
A UFRN afirma que você fraudou alguns documentos para ser beneficiado pelo argumento de inclusão. Isso é verdade?
Não! Eu não fraudei nenhum documento. Eu apenas procurei o Ensino para Jovens e Adultos tentando refazer o meu ensino Fundamental e Médio porque em 2006 eu terminei os meus estudos, mas foi um ano muito conturbado. Eu estudava em Natal e tive que ir para Goianinha, nesse período eu perdi quase que completamente o ano. Tive muita dificuldade, inclusive estava totalmente desestimulado, achando que não iria passar. E mesmo estudando apenas dois meses consegue passar no vestibular de Ciências Contábeis.
Você cursou o EJA em qual escola? E na escola eles não verificaram se você já tinha concluído o Ensino Médio?
Fiz o EJA na Escola Reginaldo Teófilo e em nenhum momento foi indagado, eu apenas preenchi o documento com meus dados pessoais e fui fazer normalmente como qualquer aluno.
Quando você entregou o documento na Comperve houve alguma recusa ou questionamento?
Eu entreguei essa documentação à Comperve antes do vestibular. Ela teve tempo de analisar porque eu entreguei os documentos no dia 28 de setembro e no dia 03 de janeiro de 2011 eles me entregaram o documento informando que eu tinha direito ao argumento de inclusão. Mesmo eles já tendo o meu certificado da escola particular porque eu passei em outros cursos da UFRN, a Comperve aprovou o meu benefício do argumento de inclusão.
Você deixou de fazer algum vestibular depois de ter recebido o resultado da UFRN?
Não fiz a 2ª fase do vestibular da Universidade da Paraíba para Medicina -fui aprovado na 1ª em 53º lugar - porque já tinha saído o resultado da UFRN. Como passei na Universidade do meu estado, devido ao prestígio e também para não tirar a vaga de ninguém, preferi não fazer a outra etapa. Na UFCG eu passei pela nota do Enem, mas não fiz a matrícula lá porque já estava matriculado na UFRN. Em nenhum momento a Universidade impediu que eu fizesse o cadastramento e a matrícula.
Você está com a consciência tranquila? Você cometeu algum tipo de fraude?
Em nenhum momento o edital diz que isso é fraude e que eu posso ser eliminado. Entreguei a documentação antes do vestibular. E eu poderia ter passado sem o argumento de inclusão. É por isso que eu quero brigar pela vaga. O que me interessa não é o primeiro lugar até porque passar em Medicina seja no 1º ao 100º já é um mérito. Eu estou há três anos estudando intensamente para passar em Medicina, é muito sacrificante.
Você pretende recorrer da decisão da UFRN? Como sente depois de tudo?
Com certeza. Estou procurando meu advogado para entrar na justiça. Eu me sinto altamente constrangido porque não fui comunicado da decisão da UFRN. Foram direto a imprensa antes de comunicar. Isso me deixou constrangido. Como é que eu vou encarar meus amigos, minha família, a sociedade depois dessas acusações.
De acordo com o advogado e mestre em Direito Constitucional, Paulo Renato Bezerra, qualquer pessoa que se utiliza do serviço público governamental com finalidade diferente da idealizada, com objetivo de obter pontuação extra em vestibular, acaba burlando a lei, ocupando uma vaga que poderia ser de quem realmente necessita concluir seus estudos e afronta a Constituição Federal.
“O argumento de inclusão existe claramente para oportunizar o acesso às Universidades Públicas de pessoas que estudaram em escolas públicas e, portanto, não conseguiram se preparar em pé de igualdade com os oriundos de escolas particulares. Aceitar uma dupla realização de ensino médio, sendo a segunda em escola pública apenas para que o benefício fosse concedido, é claramente desrespeitar até mesmo o princípio constitucional da igualdade”, disse o professor.
Ainda segundo ele, a Constituição Federal, ao dispor que a lei estabeleceria o plano nacional de educação, claramente, no art. 214, intencionou que esta colaborasse com a erradicação do analfabetismo, a universalização do atendimento escolar e a formação para o trabalho.
E é com base nessa orientação (Lei nº 9.394) que as unidades federativas, dentro de suas competências, acabaram criando políticas públicas que visassem a erradicação do analfabetismo.
“Estudar em escola particular e, depois, cursar um supletivo em escola pública para obter o benefício da pontuação extra, é burlar a intenção da própria política de inclusão. É tratar desigualmente. Mas como não houve julgamento ainda, vamos aguardar o posicionamento do Judiciário”, analisou Paulo Renato.
bate-papo - Antônio Filho » estudante
A UFRN afirma que você fraudou alguns documentos para ser beneficiado pelo argumento de inclusão. Isso é verdade?
Não! Eu não fraudei nenhum documento. Eu apenas procurei o Ensino para Jovens e Adultos tentando refazer o meu ensino Fundamental e Médio porque em 2006 eu terminei os meus estudos, mas foi um ano muito conturbado. Eu estudava em Natal e tive que ir para Goianinha, nesse período eu perdi quase que completamente o ano. Tive muita dificuldade, inclusive estava totalmente desestimulado, achando que não iria passar. E mesmo estudando apenas dois meses consegue passar no vestibular de Ciências Contábeis.
Você cursou o EJA em qual escola? E na escola eles não verificaram se você já tinha concluído o Ensino Médio?
Fiz o EJA na Escola Reginaldo Teófilo e em nenhum momento foi indagado, eu apenas preenchi o documento com meus dados pessoais e fui fazer normalmente como qualquer aluno.
Quando você entregou o documento na Comperve houve alguma recusa ou questionamento?
Eu entreguei essa documentação à Comperve antes do vestibular. Ela teve tempo de analisar porque eu entreguei os documentos no dia 28 de setembro e no dia 03 de janeiro de 2011 eles me entregaram o documento informando que eu tinha direito ao argumento de inclusão. Mesmo eles já tendo o meu certificado da escola particular porque eu passei em outros cursos da UFRN, a Comperve aprovou o meu benefício do argumento de inclusão.
Você deixou de fazer algum vestibular depois de ter recebido o resultado da UFRN?
Não fiz a 2ª fase do vestibular da Universidade da Paraíba para Medicina -fui aprovado na 1ª em 53º lugar - porque já tinha saído o resultado da UFRN. Como passei na Universidade do meu estado, devido ao prestígio e também para não tirar a vaga de ninguém, preferi não fazer a outra etapa. Na UFCG eu passei pela nota do Enem, mas não fiz a matrícula lá porque já estava matriculado na UFRN. Em nenhum momento a Universidade impediu que eu fizesse o cadastramento e a matrícula.
Você está com a consciência tranquila? Você cometeu algum tipo de fraude?
Em nenhum momento o edital diz que isso é fraude e que eu posso ser eliminado. Entreguei a documentação antes do vestibular. E eu poderia ter passado sem o argumento de inclusão. É por isso que eu quero brigar pela vaga. O que me interessa não é o primeiro lugar até porque passar em Medicina seja no 1º ao 100º já é um mérito. Eu estou há três anos estudando intensamente para passar em Medicina, é muito sacrificante.
Você pretende recorrer da decisão da UFRN? Como sente depois de tudo?
Com certeza. Estou procurando meu advogado para entrar na justiça. Eu me sinto altamente constrangido porque não fui comunicado da decisão da UFRN. Foram direto a imprensa antes de comunicar. Isso me deixou constrangido. Como é que eu vou encarar meus amigos, minha família, a sociedade depois dessas acusações.
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